RÁDIOS
Campo Grande, 24 de abril

No dia do Orgulho LGBT+, William comemora novo documento

Apoio da família foi essencial no processo de transição do professor

Por Isabelly Melo
28/06/2021 • 17h01
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Nesta segunda-feira (28) comemora-se o Dia Internacional do Orgulho LGBTQIA+, que tem como um dos objetivos centrais conscientizar a população sobre a importância do combate à homofobia. A data ficará marcada para sempre na vida do professor pós graduado, William Giusti Fabrin, de 29 anos. Homem trans, o educador recebeu hoje a nova documentação, com o nome que o representa.

Desde pequeno, o hoje homem já tinha o desejo de ser um menino, desde as roupas até o corte de cabelo. Com o passar do tempo, isso já não era o bastante para se reconhecer em frente ao espelho. “Eu não sabia o termo, homem trans né, mas sempre quis ser um garoto. Sempre sonhava na minha mente, só que eu não entendia e tinha medo de falar as coisas que passavam na minha cabeça. Levou muito tempo para eu me entender”, confidenciou William.

William pegou os novos documentos nesta segunda (28)

Na contra mão da maioria das pessoas que fazem parte da comunidade LGBTQIA+, que infelizmente não podem contar com o apoio familiar, Willian tem o amparo e apoio dos pais, inclusive foi a mãe quem escolheu o novo nome do filho.

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“Eu esperava uma atitude negativa dela, mas foi muito leve. Ela super abriu os braços, me acolheu. Eu falei que era muito importante que ela escolhesse o nome para mim, para eu me sentir acolhido. E ela disse “tudo bem, vamos pensar” e acabou que ela escolheu William”, contou o professor.

Para revelar o desejo de fazer a transição, William escreveu uma carta para a mãe, explicando situações que passou até se descobrir homem trans. Entre lágrimas e memórias, a mãe prontamente acolheu o filho, e decidiu que ele se chamaria William.

“Escrevi coisas que só eu passei, só eu vivi e ninguém nunca imaginou. Assim que eu lia eu ia explicando e lembrando fatos que aconteceram que ela poderia ter observado, mas não se atentou, ou observou e não entendeu”, relatou.

Assim como a mãe, o pai de William também acolheu o filho, mesmo de maneira virtual, por um aplicativo de mensagem, o carinho e amor do pai foi sentido na pele. “Eu quase não o vejo e assim que eu mudei minha certidão de nascimento eu mandei para ele, e ele falou “poxa, que legal, você não tirou meu sobrenome, seu nome é lindo”, aquilo foi muito bom para mim”, disse emocionado.

O amor e acolhimento da família foi o “empurrão” que faltava para William concretizar o desejo de se reconhecer no espelho. Após a autodescoberta e aceitação, ele recorreu a pesquisas para saber como funcionava o processo de transição. Inicialmente procurou em clínicas particulares, sem sucesso, foi no SUS (Sistema Único de Saúde) que o professor teve o acompanhamento hormonal necessário “O SUS tem um atendimento especializado, totalmente preparado, e comecei a hormonização com atendimento especializado médico, fazendo exames e tudo mais”.

William e a esposa

Além dos pais, Willian teve o amparo essencial da esposa, que foi a primeira a saber do desejo do professor. “Eu falei para ela que eu era trans, se não teria problema se eu mudasse e ela falou que não teria problema nenhum, que o que importa é eu ser feliz e que ela estaria comigo”. O apoio da companheira foi necessário para o período de adaptação, tanto física, quanto mental de William e das pessoas ao redor que, entre as mudanças, tiveram de ‘reaprender’ o nome do professor.

Missão nada complicada para a enteada do educador, que até se preocupou em como seria a adaptação da pequena. “A gente ficou pensando em como contar, o que falar para ela, se ela ia se adaptar ao novo nome, e hoje, quem mais me chama pelo meu novo nome é ela. Ela até corrige os outros quando alguém erra e chama pelo nome antigo”, contou.

Assim como Willian, outros milhões de brasileiros não se reconhecem ao olhar no espelho. Como o próprio professor disse, é um processo de auto descobrimento e aceitação, sendo sempre necessário estar permeado por apoio especializado, incluindo médico clínico e psicológico.

Aqueles que podem contar com o apoio familiar, conseguem trilhar o próprio caminho com mais facilidade, no entanto, aqueles que, infelizmente não tem esse apoio, podem procurar locais em que se sintam amparados e acolhidos.

Em Campo Grande e no estado, existem vários locais de apoio, entre eles a Casa Satine (@casasatine), que oferece apoio a comunidade LGBT+. Há também o MESCLA (@mesclams), Movimento de Estudo de Sexualidade, Cultura, Liberdade e Ativismo de Mato Grosso do Sul, além da Coordenadoria Municipal de Políticas e Assuntos de Diversidade Sexual (SDHU) e da Subsecretaria de Políticas Públicas LGBT do Estado de Mato Grosso do Sul (telefone: (67) 3316-9191 e e-mail: [email protected]).

“Eu deixo uma mensagem para as pessoas que estão passando pela mesma coisa que eu; encare o mundo. Dê o melhor de si em tudo que você faz, que essa bondade volta para você, as coisas boas voltam para você”, finalizou o professor.

Sobre o SUS

Em agosto de 2008, o SUS instituiu o processo transexualizador, passando a permitir o acesso da população a procedimentos com hormonização, cirurgias de modificação corporal e genital, assim como acompanhamento multiprofissional. O programa foi redefinido e ampliado pela Portaria 2803/2013, passando a incorporar como usuários do processo transexualizador do SUS os homens trans e as travestis, tendo em vista que até então apenas as mulheres trans eram assistidas pelo serviço.

São duas estruturas: Atenção Básica e a Atenção Especializada. A básica refere-se à rede responsável pelo primeiro contato com o sistema de saúde, pelas avaliações médicas e encaminhamentos para tratamentos e áreas médicas mais específicas e individualizadas. Já a especializada é dividida em duas modalidades: a ambulatorial (acompanhamento psicoterápico e hormonioterapia) e a hospitalar (realização de cirurgias e acompanhamento pré e pós-operatório). Sendo que a idade mínima para procedimentos ambulatoriais é de 18 anos, para os hospitalares 21.

Qualquer indivíduo pode procurar o sistema de saúde público e é seu direito receber atendimento humanizado, acolhedor e livre de discriminação. Infelizmente, casos de discriminação continuam ocorrendo nos atendimentos da população trans, o que a afasta ainda mais dos cuidados da saúde básica.

A pessoa trans tem o direito de pedir para atualizar o seu cadastro com seu nome social e ele tem que ser garantido pelo SUS. Juridicamente, está sancionado desde 2009 por meio da Portaria nº 1.820 que estabeleceu a Carta Direitos dos Usuários do SUS.

Até o momento, de acordo com o Ministério da Saúde, os únicos hospitais que podem realizar cirurgias de transgenitalização no Brasil pelo SUS são o Hospital das Clínicas de Porto Alegre, o HC da Universidade Federal de Goiás, em Goiânia, o HC da Universidade Federal de Pernambuco, em Recife, o HC da Universidade de São Paulo e o Hospital Universitário Pedro Ernesto, no Rio de Janeiro. Apenas três unidades fazem acompanhamento preventivo, com foco em crianças e adolescentes de 3 a 17 anos. Uma das unidades está na capital de São Paulo; outra, em Campinas; e a terceira, em Porto Alegre.

Para ter acesso aos serviços do processo transexualizador do SUS, é preciso solicitar encaminhamento na unidade básica de saúde mais próxima da sua residência. Os procedimentos mais procurados são a hormonização, seguidos de implantes de próteses mamárias e cirurgia genital em travestis e mulheres trans, assim como a mastecomia e histerectomia no caso dos homens trans. A faloplastia ainda é feita em caráter experimental no Brasil.

Importante atentar para as filas de acesso – que hoje variam em mais de 10 anos para a redesignação sexual, e buscar informações sobre os procedimentos necessários para acesso a tratamento fora de domicílio (TFD) pelo SUS, para aquelas pessoas que moram em cidades onde não haja serviços especializados.

  • Requisitos básicos para acesso ao processo Transexualizador:
  • Maior de 18 anos para iniciar o processo terapêutico e realizar hormonização;
  • Maior de 21 anos para cirurgias de redesignação sexual, com indicação médica; e
  • Necessidade de avaliações psicológicas e psiquiátricas durante um período de 2 anos, com acompanhamentos e diagnóstico final que pode encaminhar ou não a paciente para a cirurgia tão aguardada.

 

Desde junho deste 2019, a transexualidade não está mais na lista de doenças da Organização Mundial de Saúde (OMS). Segundo a entidade, a transexualidade passa a integrar como “incongruência de gênero” a categoria denominada “condições relativas à saúde sexual”.

*Informações: Agência de Notícias da Aids

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