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Repensando o conceito de serras

21 JUL 2018 • POR Arnaldo Rodrigues Menecozi* • 06h55
Cuesta da serra de Maracaju e rio Aquidauana - Reprodução/IHGMS

Desde os primeiros anos escolares aprendemos muitos conceitos que, ao longo do tempo, às vezes nem percebemos quantos equívocos fazem parte de suas explicações, quer sejam históricas ou geográficas, e nem nos damos conta quantos erros vão se formando e se solidificando ao longo do tempo. Neste artigo, o assunto em pauta refere-se a um conceito geográfico, mais precisamente no âmbito da geomorfologia. 

Aprendemos que no Brasil existem serras e mais serras. Assim como em Mato Grosso do Sul, com relevância às de Maracaju e a da Bodoquena, além de outras de caráter local, e de menor destaque.

Uma serra, no sentido geográfico, é toda elevação pontiaguda do relevo, com neve constante em suas extremidades, cujo coletivo chama-se cordilheira, como a dos Andes. No Brasil, o termo serra tem substituído a real denominação geomorfológica de determinadas escarpas de planalto que, nunca poderiam ser consideradas serras algumas elevações entre 50 a 100 metros de altitude. Há situações que são verdadeiras cuestas.

Escarpa é uma rampa ou aclive de terrenos que aparecem nas bordas das elevações, chamadas de planaltos, serras ou morros testemunhos. Há dois tipos de escarpa: as de origem tectônica, produzidas por grandes movimentações da natureza, como as do Planalto Atlântico. O outro tipo de escarpa é a de erosão, como ocorre no território sul-mato-grossense, cujos resultados abruptos foram escavados pelos agentes erosivos (vento, chuva e temperatura).  A cuesta, por sua vez, é uma forma de relevo dissimétrico que apresenta um declive suave em seu reverso, e um corte abrupto ou íngreme em seu front, ou na chamada frente de cuesta. É o tipo de relevo que predomina nas bacias sedimentares, como é o caso onde se assentam as elevações daquilo que se chamam serra de Maracaju. 

Bodoquena - As elevações da serra da Bodoquena se constituem, em verdade, um planalto com escarpas direcionadas para a planície pantaneira, sendo, portanto, significativo divisor de águas regional pelas suas dimensões. O referido Atlas Multirreferencial define as dimensões dessas elevações com aproximadamente 200 km de extensão por 65 km de largura, apresentando altimetria variando entre 400 a 650 metros. 

Com suas elevações na porção sudoeste de Mato Grosso do Sul, o que, popularmente, chamam de serra da Bodoquena apresenta um relevo com estrutura complexa, correspondendo a uma grande faixa de dobramentos lineares, composta por um conjunto de relevo disposto na direção norte-sul, tendendo para noroeste, abrangendo um corpo principal (tradicionalmente conhecido como serra da Bodoquena), além de relevos menores localmente denominados de morros ou de serras. 

Maracaju - O Atlas Multirreferencial define as elevações da chamada serra de Maracaju como um planalto e que apresenta, sobretudo em sua porção norte, mostras de piemontes (depósitos de material muito heterogêneo, como seixo, areia, argila, limo). O planalto é esculpido em rochas basálticas, originando um relevo plano ou tabular nas principais áreas elevadas, além de modelados que se elevam nas áreas de cabeceiras de drenagens e encostas. 

Além disso, o mesmo Atlas esclarece que o primeiro patamar da bacia sedimentar do Paraná, em sua porção oeste, é uma cuesta que recebe denominações locais de serras, com a de Maracaju na parte sul e a do Pantanal na parte norte. Esculpida em arenito, apresenta na borda, desnível relativo de 400 metros.

Sobre as serras, o IHGMS catalogou em Mato Grosso do Sul 49 elevações com denominações de serras.  Faz-se necessária uma mudança em tantos outros conceitos, mas no que se refere ao de serra, já vem de longa data com esse equívoco. Depende muito dos professores o início dessa provocação. E o IHGMS se propõe a engajar-se nessa empreitada.

*É geógrafo e professor universitário, associado efetivo titular da cadeira nº 30 do IHGMS.