Durante sessão da CPI do Transporte Público realizada na Câmara Municipal de Campo Grande nesta segunda-feira (16), João Resende, ex-diretor-presidente do Consórcio Guaicurus, admitiu graves descumprimentos contratuais, especialmente sobre a renovação da frota de ônibus da Capital. A audiência revelou também um profundo impasse financeiro entre o Consórcio e a Prefeitura, apontado como motivo da falta de investimentos.
Resende, que comandou o Consórcio desde o início da concessão em 2012 até janeiro deste ano, declarou que a Prefeitura não cumpre sua parte ao não garantir o equilíbrio econômico-financeiro previsto em contrato.
“A Prefeitura de Campo Grande está protelando essa questão do reequilíbrio e colocou o Consórcio em uma situação caótica”, afirmou o ex-gestor.
A renovação obrigatória da frota, com idade média prevista de cinco anos, não teria sido realizada devido a esse desequilíbrio financeiro.
Durante a sessão, os vereadores cobraram explicações sobre 97 ônibus com prazo contratual expirado. João Resende destacou que não há recursos para a aquisição de novos veículos e classificou a exigência da Agência Municipal de Regulação dos Serviços Públicos (Agereg), de substituição da frota antiga, como “impraticável” nas condições financeiras atuais.
Resende também criticou duramente os vereadores da CPI por, segundo ele, não questionarem as falhas históricas da Prefeitura no cumprimento do contrato de concessão do transporte coletivo. Citou como exemplo o projeto de R$ 120 milhões para a implantação de 58 km de corredores exclusivos para ônibus, dos quais apenas 6 km foram executados.
“O contrato foi feito com base em um projeto da prefeitura junto ao PAC da Mobilidade. A administração se comprometeu com obras e investimentos que nunca saíram do papel. E o mais grave: essa CPI não faz uma pergunta sequer sobre isso […] Os senhores não se preocuparam em saber onde está esse dinheiro. A prefeitura recebeu o recurso e não entregou as obras. Por que isso não está sendo investigado? A prefeitura não cumpre o contrato, mente ao Judiciário dizendo que cumpre e ainda deixa o sistema sucatear sem dar respostas. Mas a CPI prefere nos tratar como vilões“.
João Resende, ex-diretor-presidente do Consórcio Guaicurus
Nesse clima de forte tensão emocional, Resende chorou após ser questionado pelo vereador Wilson Lands (Avante) sobre possíveis soluções para melhorar o diálogo com a Prefeitura. O ex-diretor foi consolado pelo filho e pelo advogado que o acompanhavam.
Impasse Financeiro
A CPI também ouviu Leonardo Dias Marcello, atual diretor jurídico-administrativo do Consórcio. Marcello afirmou que sem uma tarifa justa e condizente com as premissas contratuais, o Consórcio está impossibilitado de realizar novos investimentos.
“Precisamos avaliar a situação do lado empresarial. Não podemos investir recursos em um sistema que não remunera adequadamente. A obrigação de garantir isso é da Prefeitura”, enfatizou.
O presidente da comissão, vereador Lívio Leite (União Brasil), garantiu que a renovação da frota será cobrada “de um jeito ou de outro”. Lívio frisou a necessidade de considerar o transporte coletivo como prioridade absoluta, destacando que há responsabilidade compartilhada entre Prefeitura e Consórcio.
Outro ponto crítico é a dívida da Prefeitura com o Consórcio Guaicurus, estimada preliminarmente em cerca de R$ 377 milhões, acumulada ao longo dos últimos 13 anos, segundo laudo pericial anexado em processo na Justiça.
Denúncias e próximas oitivas
Até agora, a CPI do Transporte Público já recebeu 616 denúncias da população, refletindo o descontentamento dos usuários com a qualidade do transporte coletivo oferecido em Campo Grande.
A terceira fase da CPI terá continuidade na quarta-feira (18), quando serão ouvidos o atual diretor-presidente do Consórcio Guaicurus, Themis de Oliveira, e o sócio-proprietário, Paulo Constantino.