Talita Antunes da Rocha e Camila Gebara Nogueira Yamakawa, duas atletas de alto rendimento de Mato Grosso do Sul, unidas pelo esporte e pelo desejo de serem mães. O processo, que leva em média nove meses para gerar uma nova vida, foi mais demorado para as duas, que tiveram de pensar e repensar o momento ideal.
A aquidauanense, Talita Antunes, reconhecida pelas inúmeras conquistas no vôlei de praia, chegou aos 36 anos mais certa do que nunca de que queria ser mãe e que aquele era o momento ideal. Decisão que pode até parecer rápida e unilateral, mas levou um bom tempo entre planejamentos, competições e incertezas.
“Que horas ser mãe, que momento parar, como que vai ser, como eu ia voltar. Eu tive todos esses questionamentos. Acho que toda profissão, mas a atleta pesa mais porque é o nosso corpo né, a gente trabalha com o nosso corpo. Eu sempre tive dúvidas se eu conseguiria voltar a jogar, eu queria estar com meu filho sempre junto comigo, não queria viajar tanto e ficar longe dele, então eu demorei um pouco”, contou a atleta olímpica.
Hoje, com 40 anos, Talita não tem dúvidas de que a espera foi necessária para se planejar, principalmente na parte financeira, já que são os prêmios que rendem mais dinheiro e claro, os patrocínios, que deixam de aparecer quando uma atleta decide ser mãe.
Talita, inclusive, se planejou para engravidar no fim do ano, período em que os contratos venceriam. Com a certeza de que estava grávida, muitos contratos não foram renovados. “Eu acho que é bem punitivo, entre aspas. A grande maioria não renova, são poucos que continuaram. Eu consegui me organizar de todas as formas, foi num momento que eu falei, eu tranquilamente posso fazer isso sem pensar se vai acabar a minha carreira, se eu vou ter patrocinador. Eu consegui fazer com calma, mas acho que não é a realidade do esporte no Brasil”, compartilhou.
Das areias para os tatames, a também sul-mato-grossense, Camila Gebara, de Dourados, se planejou para engravidar já sabendo que os patrocinadores não seriam uma realidade ao trocar a kimono pelas fraldas.
“Os patrocínios acabam saindo, por exemplo, o bolsa atleta; uma competição que te dá a bolsa e, querendo ou não, quando você se torna mãe é pelo menos um ano que tem que ficar fora do nível competitivo. Então, financeiramente abala sim, é o que mais afeta”, afirmou a judoca em entrevista.
Aos 24 anos, Gebara conciliou uma cirurgia no joelho, que a afastaria por pelo menos um ano dos tatames, para engravidar do pequeno Ali em 2019, no auge da pandemia. O futuro judoca era muito desejado e sonhado pelos pais, e hoje está com três anos.
Jorge Yamakawa, esposo e treinador de Camila, foi uma das várias figuras que participaram e ainda hoje fazem parte da rede de apoio da judoca, que retornou aos tatames três meses depois do parto, Conquistando o 1º lugar no Brasileiro Sênior de Judô.
“Ele me ajuda muito, quando eu viajo, ele que cuida, que faz tudo. Eu tenho uma rede de apoio enorme, sem eles eu não daria conta. Quando eu viajo, eles (família) têm um grupo que eles conversam e marcam a rotina da semana do Ali. Então, eu não tenho preocupação, quando eu viajo o coração só fica apertado pela saudade”, contou bem humorada.
Talita, que voltou as competições cinco meses após o nascimento do filho, também teve a sorte de ter uma extensa rede de apoio, que mesmo com a distância, não mediu esforços para ajudar nos cuidados com Renatinho, filho da atleta com o esposo e também treinador, Renato França.
“A minha família foi fundamental. Ela não mora no Rio, mora no Mato Grosso do Sul, mas a minha mãe, minha irmã, minhas tias, minhas amigas, primas, todo mundo me ajudou. Eu brinco que foi um revezamento. Continua, né, um revezamento”, dividiu
Para Renatinho, além da mãe, o pai também precisa se ausentar durante competições ao mesmo tempo de Talita, já que o esposo é também treinador da sul-mato-grossense. “O meu marido é técnico, hoje meu técnico também, então meu filho acaba sofrendo a ausência do pai e da mãe sempre ao mesmo tempo.”, relatou.
O conflito atleta e mãe, vai muito além dos patrocínios, se trata principalmente de entender como conciliar a esportista e competidora, com a agora mãe, entendendo, principalmente, que uma não anula a outra.
“Na minha cabeça sempre ficou essa questão, muito antes dele nascer. Psicólogo me ajudou muito, a terapia, de eu entender que minha vida continuava. Eu mulher, eu atleta e eu não seria uma mãe pior ou melhor se eu saísse de casa, se ele ficasse sobre o cuidado de outras pessoas. Mas não foi um dilema muito fácil não”, desabafou Talita.
“Ainda tem gente que tem a visão de que, se tornou mãe, aposentou. Acha que ser mãe tem que parar tudo que tá fazendo e cuidar do filho, pronto acabou”, completou Gebara.
Apesar de todas as incertezas, dificuldades e medos, assim como muitas mães Talita e Camila, abdicaram de si mesmas para um amor tão grande e indescritível. E justamente por isso, o arrependimento não faz parte do vocabulário das super atletas, e super mães.
“Não me arrependo, lógico que as vezes eu depois de um treino fulminante, quase morri no treino, 2h da manhã a criança chora eu falo, meu Deus do céu, não tenho nem perna pra levantar, mas, arrependimento jamais. Ele virou uma inspiração”, contou Camila.
Emocionada, Talita disse ter só um arrependimento: não ter sido mães mais cedo. “Com ele junto, a derrota se torna mais leve, você aceita, vira a chave mais rápido, você tem outra coisa que te dá tanta alegria que é um sorriso quando eu saio da quadra e, a vitória tem um outro sabor. Então, hoje, a vitória é muito melhor e a derrota é bem menos dolorida”.
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