Fundado em 1984 por duas mulheres, o Grupo Sabin é hoje uma das maiores redes de medicina diagnóstica da América Latina, com mais de 350 unidades no Brasil. Nesta entrevista, Sandra Soares Costa, cofundadora e presidente do Conselho de Administração, relembra os desafios de empreender em tempos de instabilidade econômica e resistência ao protagonismo feminino. Ela conta como a adoção de uma governança corporativa sólida, aliada à cultura de valorização das mulheres, consolidou o Sabin como uma empresa referência em qualidade, inovação e liderança diversa. Sandra conversou com exclusividade com a equipe da Massa FM Campo Grande, um dos veículos do Grupo RCN de Comunicação.
O grupo Sabin nasceu quando existiam poucas referências no empreendedorismo feminino. Você pode me contar como foi a sua trajetória nesse cenário?
SANDRA COSTA Eu sou mineira, saí de de Belo Horizonte, e cheguei em Brasília recém-casada e com meu filho mais velho. Logo comecei a trabalhar em um laboratório que já existia e, um ano depois a Janete Vaz, que é a minha sócia, chegou com essa ideia de montar um laboratório. Mas ali, nós ainda ficamos três anos trabalhando e, depois, em 1984, fundamos o nosso laboratório. É claro que, eu falo que empreender no Brasil é sempre difícil, você tem que estar aberto a correr riscos, ainda mais sendo duas mulheres. Naquele momento, a gente tinha a capacitação técnica, o conhecimento, mas estava naquele final de governo militar, início do governo Sarney, um momento, quando o sistema econômico de inflação era muito alta. Empreender era de muito risco, mas Brasília estava muito aberta para essa questão da carreira profissional, e eu sempre fui muito estimulada pelos meus pais, principalmente pela minha mãe, que é a minha inspiração, pela liderança. Eu tive esse exemplo muito forte dentro da minha casa. Foi assim, nesse cenário que nós começamos o Sabin que era nosso sonho. Mas é claro que de sonho não vive nenhum negócio. É preciso ter planejamento, meta, entender o negócio. E a gente queria entregar um serviço de qualidade, de inovação e, mesmo naquele contexto de algo ainda tão pequeno, a gente tinha coragem, energia e autoconfiança. E foram muitos os desafios, pois naquele momento até os anos 90, nós tivemos oito planos econômicos, três moedas. Imagina a empresa começando ali, fragilizada nas decisões do seu financeiro. Um outro obstáculo também que eu gosto muito de citar, era investir em tecnologia, tão essencial para a nossa área. As tecnologias já existiam, a gente sabia quais equipamentos necessitávamos, mas o Brasil tinha barreiras de importação. Então, nós não tínhamos como trazer esses equipamentos de fora. E, em 1994, no governo Collor, quando essas barreiras foram quebradas, foi um verdadeiro divisor de águas. Nós conseguimos melhorar a nossa eficiência analítica, a nossa qualidade. E, aí sim, nós trouxemos os sistemas realmente auditados e de qualidade. A gente partiu para um novo Sabin, um novo e importante momento de decisões, em aquisição de equipamentos. Eu falo que você tem que estar sempre aprendendo, sempre trazendo conhecimento e a gente sempre esteve muito atenta nesse sentido. Começamos aquela empresa muito pequena, com três colaboradores, mas a gente entregava essa excelência nos diagnósticos e, também, um serviço humanizado, diferenciado. E foi assim, nesse cenário e com essa cultura de qualidade na entrega do serviço, que a empresa foi sendo moldada, chegando ao que é hoje. E a gente vê esse serviço de excelência acontecendo em todas as regiões do Brasil dentro do Sabin.
Atualmente o quadro de funcionários da Sabin é 77% composto por mulheres e elas ocupam 74% dos cargos de liderança na empresa. Como vocês criaram essa cultura de valorizar a força de trabalho feminino?
SANDRA COSTA O segmento de Saúde, normalmente, já emprega uma força de trabalho feminino muito grande. Mas no nosso caso, é bem maior, porque nós somos uma empresa fundada por duas mulheres, de uma essência do DNA muito feminino. Então, nós criamos políticas voltadas para as mulheres, entendemos que elas têm que ter voz, nós entendemos o potencial das mulheres e sabemos que a gente tem que criar oportunidade para que elas possam crescer, possam ocupar espaços, não só espaços, mas espaços realmente de decisão dentro da nossa empresa, da nossa organização. Agora, isso não é apenas uma estatística, isso é o resultado do nosso compromisso com a diversidade, com a inclusão e mais, eu acho que reforça a nossa crença de que liderança não é uma questão de gênero, não é apenas isso, mas liderança é o resultado de competência, de habilidade, de inovação, da pessoa realmente estar preparada para assumir aquela posição. Não é apenas porque ela é mulher, mas porque ela tem realmente competência. E quando a gente tem uma diversidade na liderança, fortalece muito a nossa cultura organizacional, aprimora a tomada de decisão e, inclusive, traz uma resiliência muito maior.
Qual foi o momento decisivo para que a empresa alcançasse o nível de consolidação que tem hoje, entre os maiores e mais respeitados laboratórios de diagnóstico da América Latina?
SANDRA COSTA Foi mais ou menos em 2012, quando nós já éramos o maior laboratório do Distrito Federal e aconteceu o grande ponto de inflexão, no qual todos os nossos players estavam passando por um processo de grande consolidação, de fusão e aquisição. Decidimos, ali, que a gente realmente não queria vender o nosso negócio, mas precisávamos pensar o futuro, pensar no longo prazo. E nós decidimos crescer e levar a nossa cultura, levar o nosso modelo de gestão, o nosso trabalho de qualidade, de excelência para todo o Brasil. E existe um outro ponto importante também, que eu falo que foram vários eixos pois nós entendemos que todas as grandes decisões deveriam ser tomadas também em uma outra instância. Então, nessa época, a empresa tinha 30 anos, hoje está com 41, e nós decidimos implementar o nosso modelo de governança corporativa. Começamos a trabalhar a nossa sucessão. Muitas empresas fazem isso quando um dos sócios morre, mas precisamos pensar na longevidade, na perenidade do negócio. E, naquele momento, nós tivemos que redesenhar 30 anos de uma gestão exitosa, tivemos que redesenhar todo um processo para entregar a um grupo de gestores, escolhidos por nós, entre pessoas formadas dentro da nossa empresa. E não foi fácil deixar aquele espaço de poder, de controle, para entregar para outra pessoa. E quando você está na posição de conselho, você está só na decisão estratégica, mas a operação está sendo conduzida pela equipe de profissionais. Você vai escolher um presidente, os diretores. E, foi isso que nós fizemos. Então, foi um momento muito delicado, mas essa governança que nós instituímos, hoje é o alicerce, porque a governança traz transparência, equidade, responsabilidade, sustentabilidade, e mostra claramente para os colaboradores, para o mercado, para onde você quer ir. Já está tudo decidido. E um outro ponto importante, ao escolher a nossa presidente, que é uma mulher também, nós escolhemos a doutora Lídia, que é uma colaboradora, que entrou no Sabin como trainee. Foi um talento, uma pessoa que cresceu dentro da empresa, e a gente mostra que nós não estamos apenas no discurso, mas criando oportunidades e capacitando pessoas dentro da empresa.