
O Brasil corre o risco de se tornar ingovernável a partir de 2027 caso não haja uma reforma profunda no regime fiscal. O alerta consta no 101º Relatório de Acompanhamento Fiscal (RAF), elaborado pela Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado Federal.
O documento projeta uma dívida bruta do governo geral de 100% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2030 e 124,9% em 2035, com crescimento sustentado por déficits primários sucessivos e crescentes.
Regime fiscal é considerado insustentável
Segundo o estudo, o atual regime fiscal é insustentável e pode comprometer não apenas a capacidade de investimento do Estado, mas também a própria manutenção de serviços essenciais.
“O estrangulamento fiscal” é apontado como o centro do debate econômico, e a combinação entre aumento das despesas obrigatórias e queda na receita pública torna o quadro cada vez mais crítico.
A projeção da IFI mostra uma escalada constante da dívida: 77,6% do PIB em 2025, 82,4% em 2026 e 100% já em 2030. Se nada for feito, esse número pode atingir 124,9% do PIB até 2035.
A expectativa de crescimento da economia também é baixa: o PIB avançaria em média apenas 2,2% ao ano entre 2022 e 2035, ritmo insuficiente para equilibrar a trajetória da dívida.
Receitas caem, despesas aumentam
A receita primária líquida do governo central (arrecadação total do governo federal descontadas as transferências obrigatórias a estados e municípios), que em 2025 deve atingir 18,3% do PIB, tende a cair para 17,7% até 2035.
Em contrapartida, as despesas primárias (gastos do governo com saúde, educação, Previdência e demais áreas, excluindo os juros da dívida) sobem de 18,9% para 20,4% do PIB no mesmo período.
Isso gera um déficit estimado em 0,66% do PIB em 2025, chegando a 3% em 2032. “A partir de 2027, o estrangulamento é absoluto”, afirma a IFI.
Parte significativa das despesas cresce automaticamente, com valores atrelados ao salário mínimo e às vinculações constitucionais para saúde e educação, o que limita ainda mais a margem de manobra do governo.
Ao mesmo tempo, o potencial de arrecadação também está se esgotando: a carga tributária chegou a 34,24% do PIB em 2024, segudo dados do FGV/IBRE, o que reduz o espaço para novos aumentos de impostos.
Meta fiscal distante da realidade
O relatório também destaca que, mesmo com os contingenciamentos já anunciados de R$ 20,7 bilhões, o centro da meta fiscal de 2025 não será alcançado. Para cumprir rigorosamente a meta, seriam necessários mais R$ 30,9 bilhões em cortes.
A expectativa da IFI é de que, mesmo com as flexibilidades do arcabouço fiscal, o resultado primário de R$ 83,1 bilhões de déficit em 2025 contribuirá diretamente para o crescimento da dívida.
O estudo alerta ainda que, mantido o ritmo atual, as metas fiscais previstas na Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2026 já são consideradas inatingíveis. A utilização de medidas artificiais para mascarar a realidade fiscal, como a compensação de metas entre orçamentos e a transformação de despesas em créditos tributários, também preocupa. A IFI afirma que tais ações comprometem a credibilidade da política fiscal brasileira.
Soluções exigem vontade política
Para evitar um colapso, a saída apontada pela IFI é uma reforma estrutural que recupere a capacidade de investimento do governo, estanque o crescimento da dívida e permita equilíbrio nas contas de estados e municípios.
O estudo reconhece que os desafios são econômicos, mas ressalta que as soluções são essencialmente políticas.
“Os gargalos são econômicos, as soluções são políticas. Só um amplo diálogo entre Congresso Nacional, governo e sociedade pode arquitetar as saídas para a grave situação do quadro fiscal”, conclui o documento.