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SAÚDE INDÍGENA

Estudo revela água sem tratamento para 85% das crianças indígenas em Dourados

Pesquisa da Fiocruz mostra vulnerabilidade em aldeias Bororó e Jaguapirú

Levantamento aponta risco elevado de doenças diarreicas em bebês (Foto: Reprodução/ Fiocruz)
Levantamento aponta risco elevado de doenças diarreicas em bebês (Foto: Reprodução/ Fiocruz)

Um estudo conduzido pela Fiocruz apontou que 85,6% da água consumida por crianças indígenas menores de um ano nas aldeias Bororó e Jaguapirú, em Dourados, não passa por qualquer tratamento. O levantamento avaliou as condições de abastecimento e saneamento em 371 domicílios e revela um cenário crônico de risco para doenças diarreicas — uma das principais causas de mortalidade infantil em comunidades tradicionais.

O trabalho de campo começou em setembro e foi coordenado pela pesquisadora Renata Picoli, da Fiocruz Mato Grosso do Sul. As aldeias estudadas acumulam anos de vulnerabilidade relacionada ao acesso irregular à água potável e à precariedade do saneamento básico, fatores que ampliam infecções gastrointestinais e agravam quadros de desnutrição.

As coletas de água e fezes foram realizadas por agentes indígenas capacitados, que também participam do monitoramento do crescimento das crianças. Além da análise laboratorial, o estudo mapeia determinantes sociais e busca fortalecer a vigilância em saúde no território.

Segundo Picoli, os resultados devem orientar ações do Subsistema de Atenção à Saúde Indígena (SasiSUS).

“São dados essenciais para reduzir desigualdades e melhorar as políticas voltadas à primeira infância indígena”, afirma.

Abastecimento e Saneamento: Um Panorama Crítico

O estudo mostra que 97,2% das casas recebem água da rede mantida pela Secretária Especial de Saúde Indígena (Sesai), e 2,8% utilizam poço artesiano. Em 77,4% dos domicílios, a água chega apenas até o terreno, sem encanamento interno. Quase 85% das famílias armazenam água em recipientes improvisados, como caixas-d’água no chão (75,9%), tambores e baldes (10,8%) e galões (3,6%).

A coleta de esgoto é ainda mais precária: 66,4% das famílias utilizam latrinas fora de casa e 100% dependem de fossas rudimentares. A pesquisadora alerta que a disposição facilita infiltração de resíduos no solo e aumenta o risco de contaminação fecal-oral, especialmente entre crianças pequenas.

Impacto na Mortalidade Infantil – acima da média nacional

O Brasil reduziu a mortalidade infantil de 90 óbitos por mil nascidos vivos em 1990 para 15,7 em 2023, mas o indicador segue desigual. Entre crianças indígenas menores de um ano, a taxa chegou a 19,4 por mil em 2021, recuando para 17,3 em 2022 — ainda acima da média nacional.

Para a equipe da Fiocruz, as condições observadas em Dourados ajudam a explicar parte dessa persistência: saneamento precário, água insegura e exposição frequente a doenças infecciosas continuam a ameaçar a sobrevivência infantil nas aldeias.