Na tarde desta segunda-feira, 12 de maio de 2025, a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Transporte Coletivo Urbano de Campo Grande ouviu dois servidores da Agência Municipal de Transporte e Trânsito (Agetran), no Plenarinho da Câmara Municipal. Os depoimentos integram a segunda fase da investigação, que busca esclarecer falhas na fiscalização e na qualidade do serviço prestado pelo Consórcio Guaicurus.
No início da sessão, o presidente da CPI, vereador Dr. Lívio (União), apresentou uma denúncia anônima feita por um servidor da Agência Municipal de Regulação dos Serviços Públicos (Agereg). Segundo a denúncia encaminhada por e-mail para os vereadores, as recentes pesquisas de satisfação sobre o serviço, divulgadas pela agência, foram manipuladas para favorecer o Consórcio Guaicurus.
O denunciante afirma que os dados foram inflados deliberadamente para criar uma imagem positiva do serviço, apesar das recorrentes reclamações da população sobre superlotação, atrasos e falta de acessibilidade.
“Os resultados foram manipulados para apresentar um número significativamente maior de respostas positivas, quando na verdade os dados brutos indicavam altos índices de insatisfação e críticas recorrentes”.
trecho da denúncia anônima enviada por servidor da Prefeitura de Campo Grande
Servidor por 37 anos
O primeiro a depor foi o engenheiro civil e fiscal aposentado da Agência Municipal de Transporte e Trânsito (Agetran), Luiz Carlos Alencar Filho.
Ele deixou o serviço público neste ano e destacou a queda no total de usuários ao longo dos anos.
“Em 2012 era uma realidade, tinha passageiros suficientes para manter uma frota maior […] Ficou equilibrada a demanda até 2016 com 6 milhões e meio de passageiros por mês. Aí começou a declinar. Em 2017 já era em torno de 4 milhões de passageiros transportados. Hoje está transportando em torno de 3,3 milhões“, informou Alencar Filho.
O ex-fiscal disse aos vereadores que a pesquisa de satisfação não retrata a realidade dos usuários porque utiliza indicadores falhos e, frequentemente, as denúncias da população não eram devidamente apuradas devido à ausência de mecanismos eficientes de controle.
Alencar Filho também apontou que a frota envelhecida contribui para o aumento de problemas operacionais, como a falta de motoristas, e o aumento nos custos de manutenção.
Ao ser questionado sobre a limpeza dos veículos, ele revelou que a última higienização completa dos ônibus do Consórcio Guaicurus ocorreu há cerca de três meses, destacando a dificuldade em fiscalizar todos os 460 veículos da frota.
Infrações e ônibus ‘fantasmas’
O auditor-chefe da Agetran, Henrique de Matos Moraes, apresentou dados alarmantes: em menos de cinco meses, o Consórcio Guaicurus acumulou 1.726 infrações.
Entre elas, destacam-se 592 autos por atrasos superiores ao limite tolerado, 178 por omissão de chegada – quando os ônibus não passam pelo terminal -, 164 por omissão de saída e 144 por omissão de viagem, os chamados “ônibus fantasmas” que não realizaram as viagens programadas.
Além disso, a ausência de veículos reserva resultou em 110 infrações.
Durante o depoimento, Moraes admitiu que os relatórios de desempenho do transporte coletivo, como o Relatório dos Índices de Monitoramento (Remid), são baseados em dados fornecidos pelo próprio Consórcio Guaicurus, sem verificação independente por parte da Agetran.
Questionado sobre a veracidade dos dados que indicavam 100% de acessibilidade na frota, ele respondeu: “Assinei por protocolo. Não achei necessário ir ao local”.
Única auditoria
A audiência desta segunda-feira da CPI do Transporte Coletivo Urbano também destacou a ausência de auditorias no serviço prestado pelo Consórcio Guaicurus.
Moraes confirmou que a unidade de auditoria foi criada há apenas três anos, em 2022, uma década após a assinatura do contrato com a Prefeitura, por exigência do Tribunal de Contas do Estado. E, somente agora, em 2025, o serviço passa pela primeira auditoria e não analisa todos os indicadores apontados.
Questão de formalidade
Durante o depoimento desta tarde, o auditor-chefe da Agetran, Henrique de Matos Moraes, se referiu a um dos parlamentares em tom irônico. “Meu irmão, relaxa“, disse.
Em seguida, ele foi repreendido pelo presidente da CPI. “Eu só queria que a gente mantivesse a formalidade. O vereador Coringa não é ‘irmão’. Ele é vereador”, disse Dr. Lívio.
A próxima oitiva está marcada para quarta-feira (14), às 14h, quando será ouvido o diretor-presidente da Agetran, Paulo da Silva.