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ENTREVISTA

Proposta de fim da escala 6x1 exige debate técnico e atenção à realidade brasileira, diz superintendente

Alexandre Cantero defende discussão madura sobre jornada de trabalho e destaca desafios para pequenas empresas e risco de aumento na informalidade

Alexandre Cantero nos estúdios da Massa FM Campo Grande - Foto: Luiz Gustavo Soares/Portal RCN67
Alexandre Cantero nos estúdios da Massa FM Campo Grande - Foto: Luiz Gustavo Soares/Portal RCN67

Durante entrevista ao programa Microfone Aberto, da Massa FM Campo Grande, o superintendente Regional do Trabalho e Emprego em Mato Grosso do Sul, Alexandre Cantero, defendeu uma discussão técnica, sem paixões políticas, sobre a proposta que visa substituir a atual escala de trabalho 6×1 no Brasil.

O tema voltou ao centro dos debates após a apresentação de uma proposta de emenda à Constituição (PEC) pela deputada federal Erika Hilton (PSOL), que propõe a revisão do atual modelo, inspirando-se em experiências adotadas por países europeus como Islândia, Bélgica, Inglaterra e Holanda.

Cantero reconheceu que a redução da jornada pode trazer ganhos à qualidade de vida do trabalhador e até ganhos de produtividade, mas alertou para a realidade econômica brasileira, especialmente entre micro e pequenas empresas.

“É preciso avaliar se esse modelo será viável, principalmente em setores com margens apertadas e pouca capacidade de absorver custos adicionais. Isso pode, inclusive, inviabilizar pequenos negócios”, argumentou.

O superintendente pontuou ainda que, embora a discussão envolva o bem-estar dos trabalhadores, há aspectos que precisam ser avaliados com cautela. Um deles é o risco de que, ao trabalhar menos em um emprego formal, muitos profissionais recorram a uma segunda atividade para complementar a renda.

“Com a atual faixa salarial e o custo de vida no país, muitos trabalhadores acumulam jornadas. Sem uma política de compensação adequada, a redução da jornada pode não representar mais descanso, mas sim mais trabalho informal”, destacou.

Cantero também criticou a elevada carga tributária como uma das causas centrais da informalidade e da precarização das relações de trabalho. “A tributação que recai sobre quem emprega e sobre o trabalhador é um dos maiores entraves. O chamado ‘Custo Brasil’ impacta diretamente no valor dos salários e na geração de empregos”, reforçou.

Sobre alternativas, o superintendente citou a negociação coletiva como uma possível via para implementar mudanças no modelo de jornada, mas apontou dificuldades. Segundo ele, desde a reforma trabalhista de 2017, os sindicatos perderam força e base financeira, o que compromete sua capacidade de representar os interesses dos trabalhadores de forma efetiva.

“Temos uma legislação reformada, mas com estrutura sindical antiga, de 1943. Isso precisa ser revisto”, afirmou.

Combate ao trabalho escravo: tecnologia como aliada

Ao final da entrevista, Alexandre Cantero abordou outra frente de atuação da Superintendência Regional do Trabalho: o combate ao trabalho escravo contemporâneo. Ele destacou a importância da data de ontem, que marcou os 30 anos da criação da unidade móvel de fiscalização, ferramenta usada em todo o Brasil e que teve origem justamente em Mato Grosso do Sul.

Segundo ele, a superintendência firmou uma parceria inédita com a Receita Federal para reforçar o combate às condições análogas à escravidão em áreas remotas do estado. Por meio do acordo, drones, celulares e computadores de última geração apreendidos em ações de combate ao contrabando e descaminho estão sendo repassados para equipar as equipes de fiscalização.

“O uso da tecnologia aumenta a efetividade dessas ações, especialmente em regiões de difícil acesso. Não podemos mais tolerar que, em pleno século 21, pessoas ainda sejam resgatadas em situação de escravidão”, disse Cantero, enfatizando que a prática, além de violar direitos humanos, afeta a imagem internacional do agronegócio brasileiro.

“É uma chaga social que precisa ser erradicada. As nossas commodities concorrem no mercado internacional, e nossos competidores não hesitam em apontar essas falhas como argumento comercial. Portanto, combater o trabalho escravo é também uma ação estratégica de sustentabilidade e posicionamento econômico do Brasil no cenário global”, concluiu.