
Será publicado na edição de fevereiro de 2026 da The Lancet Regional Health – Americas um estudo que aponta que a liberação em massa de mosquitos Aedes aegypti com Wolbachia reduziu em 63,2% a incidência de dengue em Campo Grande. A análise compara o comportamento da doença antes e depois da intervenção, que ocorreu entre 2020 e 2023, e mostra que a cidade deixou de registrar surtos na mesma magnitude observada no período anterior.
A técnica consiste em introduzir a bactéria Wolbachia — presente naturalmente em outros insetos — no Aedes aegypti. A presença da bactéria impede que o vírus da dengue se multiplique dentro do mosquito, reduzindo a transmissão. Campo Grande atingiu, em 2024, prevalência média de 86,4% de mosquitos com Wolbachia, com 89% das áreas monitoradas acima do limiar de estabilidade, fixado em 60%.
Colaboração e Avaliação Científica
A pesquisa é resultado de uma colaboração que envolve Fiocruz Mato Grosso do Sul e Minas, universidades americanas como Yale, Stanford e Johns Hopkins, além da USP, Monash University, o World Mosquito Program e as secretarias municipal e estadual de saúde. É a primeira avaliação científica programática do método como política pública financiada pelo Ministério da Saúde.
Ao longo de três anos, mais de 100 milhões de mosquitos foram liberados em seis zonas urbanas. O monitoramento foi feito por meio de 1.677 ovitrampas espalhadas pela cidade para acompanhar a presença da bactéria mês a mês.
Impacto da Intervenção e Próximos Passos
A série histórica de casos de dengue, de 2008 a 2024, reforça o impacto da intervenção. Antes do método, a cidade ultrapassava com frequência 4,7 mil casos por ano. Depois, registrou 410 notificações em 2021, 8.045 em 2022, 11.406 em 2023 e 605 até setembro de 2024. Segundo os pesquisadores, quanto maior a prevalência da bactéria, menor o número de casos.
O artigo destaca que o método não utiliza produtos químicos e funciona de forma autossustentável após atingir estabilidade na população de mosquitos. A estratégia se soma às demais ações de controle, como eliminação de criadouros e vacinação.
A Fiocruz MS coordenou a execução local, produção científica e vigilância epidemiológica. A Secretaria Municipal de Saúde atuou na logística de campo, e a Secretaria de Estado de Saúde apoiou com infraestrutura e equipes técnicas.
Para os autores, o conjunto de evidências aponta que o método tem viabilidade técnica, boa aceitação comunitária e impacto epidemiológico consistente — características que podem embasar sua expansão para outras cidades em cenário de alta circulação de arboviroses no país.