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Escala 6x1 exige debate técnico e atenção à realidade do Brasil, diz superintendente

Superintendente do Trabalho acompanha discussões sobre jornada 6x1 e atua no acolhimento de imigrantes internacionais

Superitendente do Trabalho em Mato Grosso do Sul, Alexandre Cantero, nos estúdios da Massa FM Campo Grande - Reprodução / Arquivo RCN
Superitendente do Trabalho em Mato Grosso do Sul, Alexandre Cantero, nos estúdios da Massa FM Campo Grande - Reprodução / Arquivo RCN

Nestes dias em que a proposta da jornada 6×1 tramita em Brasília, é importante que haja discussão técnica. Também é necessário total atenção à realidade brasileira. Esta é a avaliação do superintendente do Trabalho em Mato Grosso do Sul, Alexandre Cantero. Esse tema voltou ao centro dos debates após a apresentação de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) de autoria da deputada federal Erika Hilton (PSOL).

O texto dispõe sobre a revisão do atual modelo, inspirando-se em experiências adotadas por países europeus como Islândia, Bélgica, Inglaterra e Holanda.

Cantero reconhece que a redução da jornada, sem prejuízos nos vencimentos, pode trazer ganhos à qualidade de vida do trabalhador. Até ganhos de produtividade são possíveis. No entanto, ele alerta para a realidade econômica brasileira, especialmente entre micro e pequenas empresas.

Nesta entrevista ele destaca o tema. Além disso, fala sobre as ações de combate ao trabalho escravo em Mato Grosso do Sul e iniciativas voltadas ao imigrante internacional.

Essa proposta, que dá certo em outros países, tem chances de dar certo por aqui?

“Nós temos que verificar primeiro se isso não vai impor que o trabalhador tenha um outro trabalho, considerando a faixa salarial brasileira. Há que se analisar como a maioria das micro e pequenas empresas vão poder incorporar isso no negócio. Porque isso representa custo. Além disso, é necessário avaliar se vai haver alguma subvenção, algum incentivo fiscal nesse sentido. Mas é claro que essa questão da jornada de trabalho, essa discussão que está posta no Congresso, é importante para a sociedade. Pois a redução da jornada de trabalho – considerando, inclusive, as inovações no mundo do trabalho pós-pandemia, especialmente – representa não apenas qualidade de vida. Ela também resulta em menor risco de acidente de trabalho, menor estresse ocupacional. Tem vários aspectos positivos. Contudo, tem que se olhar a particularidade da realidade brasileira também.”


Existe a possibilidade do trabalhador, que quer melhorar a renda e ter um tempo livre, buscar outro trabalho, gerando sobrecarga, Isso pode?

“Eu acredito que tanto o setor empresarial, quanto os trabalhadores, com a mediação do governo, devem fazer essa discussão de maneira madura. Porque, é fato que muitas empresas de vários setores não ficam nem com a jornada 6×1. Ocorre a prática da questão de banco de horas, da jornada extraordinária, evitando a abertura de novos postos de trabalho. Isso muitas vezes reflete no adoecimento, número de acidentes de trabalho. E o adoecimento e acidente de trabalho refletem na previdência social. Sem contar que um ponto converge tanto para os trabalhadores quanto para o setor produtivo: a questão trabalhista – sobre quem emprega e quem é empregado. Eu penso que o grande vilão da informalidade, e também contribui muito para muitas vezes para o baixo salário, é a carga tributária que existe hoje no Brasil, o chamado custo Brasil.”

E existe alguma alternativa para isso?

“Uma alternativa, que foi até citada pelo Ministro do Trabalho, seria a negociação coletiva. Mas a realidade é que, após a reforma trabalhista de 2017, os sindicatos estão muito enfraquecidos. Foi retirada a base de sustentação financeira dos sindicatos. Além disso, não houve uma reforma ou legislação para modernizar isso. Então nós temos uma reforma trabalhista de 2017, mas com um modelo sindical ainda de 43, inspirada na Carta del Lavoro, lá na Itália. Então eu acho que tem que ser discutido. Alguns setores merecem essa redução de jornada. No entanto, você precisa conversar também com quem emprega. Porque não tem condições de você fazer uma redução sem contrapartida.”

Mudando de assunto e falando sobre o combate ao trabalho escravo. A tecnologia está ajudando nas fiscalizações?

“Ontem completamos 30 anos da unidade móvel de combate ao trabalho escravo. Mato Grosso do Sul foi pioneiro nisso. Hoje temos uma parceria com a Receita Federal que repassa drones, celulares e computadores de última geração — frutos de apreensões — para equipar nossas fiscalizações em áreas remotas. Isso aumenta a efetividade das ações. Costumo dizer que o trabalho escravo é uma chaga social que não combina com a pujança do agro em MS. E, comercialmente falando, isso afeta até as exportações das nossas commodities. Mato Grosso do Sul exporta muito, e isso é um defeito apontado pelos nossos concorrentes no mercado internacional. Ou seja, é uma política de direitos humanos, mas também é uma política de sustentabilidade. Isso precisa ser observada pra que a gente tenha posicionamento comercial aí no mundo.”

O órgão também tem a sala do imigrante. O que é isso e como funciona?

“Montamos a sala do imigrante para combater o tráfico de pessoas e direcionar as pessoas resgatadas de trabalhos análogos à escravidão. Também buscamos auxiliar o setor produtivo. Então, a gente aliou a necessidade do setor produtivo com a da mão de obra. Fizemos a inclusão dessas pessoas que chegam aqui no estado de Mato Grosso do Sul. A maioria dessas pessoas chega arrasada, fugindo de ditaduras como a da Venezuela, crises humanitárias no Haiti, ou guerras — como palestinos e sírios. Eles vêm com o compromisso de recomeçar a vida.

Muitos têm, inclusive, mais comprometimento que trabalhadores brasileiros, porque não podem errar. E é importante destacar: eles não estão tirando empregos. Em 2024, fechamos o ano com mais de 24 mil vagas abertas e não preenchidas no estado. Os migrantes representam uma parcela mínima do mercado e são essenciais para o setor produtivo.

Também temos o Espaço do Saber, uma parceria da Federação da Indústria e a UEMS. E lá nós oferecemos aulas de português porque o idioma também é uma barreira para o migrante internacional se inserir na sociedade do mercado de trabalho.”