O estudante do quinto ano do curso de Medicina, do campus da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS) de Três Lagoas, Léo Morato foi selecionado para participar do MIT Hacking Medicine e teve sua ideia escolhida como a vencedora em uma das categorias. Trata-se de uma iniciativa que nasceu no Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), nos Estados Unidos, e foi trazida para o Brasil, pela primeira vez, pelo Hospital Israelita Albert Einstein, por meio da Eretz.bio (hub de startups do Hospital).
O hackathon reuniu profissionais e estudantes da área de saúde, tecnologia, negócios e design em uma experiência imersiva, com participação ativa. Durante os três dias de evento, os participantes colaboraram em equipes para propor soluções inovadoras na área de saúde relacionadas a duas temáticas voltadas para desafios reais e que gerassem impactos significativos na área: disfunções metabólicas ligadas a esteatose hepática e inflamação e doenças cardiovasculares. São doenças silenciosas que seguem sendo subdiagnosticadas, subtratadas e subestimadas.
“Eu sempre acreditei que grande parte da formação médica acontece para além das salas de aula e dos estágios. Apesar da solidez acadêmica da UFMS, percebo que, assim como em muitas outras escolas médicas do país, ainda existem lacunas em temas fundamentais para a nossa prática. A graduação me oferece uma base clínica muito forte, mas assuntos como inovação, tecnologia e empreendedorismo em saúde quase nunca aparecem no currículo formal. E foi justamente nesse cenário que eu comecei a buscar experiências diferentes, que me tirassem da zona de conforto e me permitissem desenvolver competências que considero essenciais para o futuro da medicina”, disse Morato.
O estudante revelou ter descoberto nesse processo uma afinidade pela criação de soluções tecnológicas aplicadas à saúde pública.
“Sempre tive interesse por inteligência artificial, mas foi nos últimos anos que entendi como ela pode se tornar uma ferramenta poderosa para reduzir desigualdades de acesso. O Brasil é um país de contrastes: temos centros de excelência em grandes capitais e, ao mesmo tempo, regiões inteiras sem acesso a especialistas. Essa realidade sempre me incomodou. Eu queria encontrar uma forma de usar tecnologia para aproximar quem mais precisa da medicina de qualidade”, destacou.
“Foi nesse contexto que conheci o MIT Hacking Medicine, um programa que já instigou a criação de inúmeras startups e inúmeras soluções em saúde no mundo todo, e que aconteceria pela primeira vez no Brasil, em parceria com o Hospital Israelita Albert Einstein, a maior referência nacional em inovação em saúde na minha visão. Logo que vi a chamada para inscrição, percebi que seria uma oportunidade única. Mas, ao mesmo tempo, veio a insegurança: todo o evento seria conduzido em inglês, e eu não considero meu nível de inglês tão bom assim. Além disso, é um evento de relevância mundial, não sei até que ponto estou apto para estar lá. Cheguei a pensar se não seria uma barreira grande demais. No entanto, decidi que não podia deixar esse medo me paralisar. Encarei o desafio, participei do processo seletivo e deu certo”, contou.
Léo foi para São Paulo disposto a mergulhar no ambiente de inovação proporcionado pela competição.
“Logo no primeiro dia, cada participante teria 45 segundos para apresentar um problema e uma possível solução. Esse momento foi decisivo para mim. Peguei o microfone e falei sobre meu desejo de criar uma tecnologia que pudesse ampliar o alcance da saúde em regiões remotas, como a Amazônia, onde os profissionais de saúde dificilmente chegam. A ideia era transformar o agente comunitário de saúde em protagonista, apoiado por um sistema inteligente capaz de conduzir entrevistas estruturadas, identificar sinais de risco e priorizar os encaminhamentos médicos”, relatou.
“Para minha surpresa, a proposta chamou a atenção de outros participantes. Aos poucos, fomos nos aproximando e, ao final daquele primeiro dia, tínhamos formado um time multidisciplinar. Nossa equipe ficou composta por Vívian Amaran (medicina intensiva e pediatria), Maria Gabriela Von Adamek (engenheria biomédica); Klayvem Guimarães (programação e background em IA); e Larissa Maia (contábeis e business). A diversidade de conhecimentos foi fundamental para que a ideia ganhasse forma”, destacou o estudante.
“Juntos, criamos a Connect Remote Care – Core Care. A ferramenta funciona mesmo off-line, o que é essencial em áreas sem internet ou telefonia. Através da coleta de informações por agentes locais, ele integra diretrizes médicas, inteligência artificial e dados clínicos para antecipar trechos de consultas, estratificar pacientes conforme a gravidade e orientar encaminhamentos de forma muito mais estratégica”.
O grupo também levou em consideração o possível diálogo entre a solução e o que há no local que pudesse ser aproveitado.
“Pensamos em como a solução poderia dialogar com iniciativas já existentes, como os barcos de atendimento que percorrem comunidades ribeirinhas na Amazônia. A ideia era clara: não substituir o médico, mas dar condições para que os profissionais de saúde chegassem de forma mais rápida e eficiente a quem mais precisa”, falou.
Para o estudante, um dos obstáculos mais fortes era o tempo.
“Em apenas três dias, precisávamos sair da ideia e chegar a um MVP, o mínimo produto viável. Foi um período intenso de trabalho, muitas horas seguidas de discussão, prototipagem e ajustes. Mas também foi uma oportunidade única de receber mentorias de alto nível. Ao longo do evento, especialistas do MIT, do Einstein e de instituições internacionais passavam pelas equipes, ouviam nossas propostas e ofereciam sugestões para melhorar. Essa troca foi essencial para que conseguíssemos evoluir rápido e apresentar algo consistente”, lembrou.
“No domingo, durante a apresentação final, sentimos que havíamos dado o nosso melhor. Ainda assim, o anúncio da vitória na track de doenças cardiovasculares foi uma grande surpresa. Ouvir o nome da nossa equipe naquele palco foi emocionante. Era a validação de que a ideia tinha relevância, potencial de impacto e poderia, de fato, transformar realidades”, comemorou.
Após a vitória, o próximo desafio e conciliar a distância entre os integrantes da equipe.
“Claro que agora vêm novos desafios. Conciliar a distância geográfica entre os membros da equipe, as rotinas profissionais e acadêmicas já tão corridas e, ao mesmo tempo, encontrar o tempo necessário para amadurecer o projeto não será simples. Mas todos nós temos clareza de que vale a pena. O objetivo é avançar até chegar a um modelo funcional em larga escala, capaz de gerar as mudanças que motivaram a criação do Core Care”, contou.
“Para mim, essa experiência foi profundamente transformadora. Aprendi muito mais do que técnicas de inovação. Conheci pessoas que me abriram portas, mergulhei em novas áreas da medicina, desenvolvi melhor minhas habilidades no uso de inteligência artificial aplicada à saúde e construí uma rede de networking sólida. Sinto que saí do evento não apenas com um prêmio, mas com uma visão ampliada do que significa ser médico hoje. Mais do que dominar o conhecimento técnico, é preciso estar disposto a inovar, a aprender continuamente e a buscar soluções que façam sentido para a sociedade. Essa vitória representa um passo importante na minha formação e reforça meu desejo de construir uma carreira que una medicina, tecnologia e impacto social”, avaliou.
*Informações da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul