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Entrevista

Novo protocolo da Polícia Civil busca garantir a saúde mental de policiais

Medida prevê ações para todo o estado e inclui atendimento após incidentes críticos

Delegado Fabiano Nagata e psicóloga Fabiana Pedraza, do Cape/DGPC participaram do programa Microfone Aberto, da rádio Massa FM Campo Grande. Foto: Adriano Hany/RCN 67.
Delegado Fabiano Nagata e psicóloga Fabiana Pedraza, do Cape/DGPC participaram do programa Microfone Aberto, da rádio Massa FM Campo Grande. Foto: Adriano Hany/RCN 67.

APolícia Civil de Mato Grosso do Sul instituiu um novo protocolo para acolhimento psicológico de servidores envolvidos em situações de alto impacto emocional, como confrontos armados, mortes de colegas, acidentes graves ou atendimento a tragédias. O chamado “Protocolo de Intervenção em Incidentes Críticos”, prevê ações imediatas de escuta e apoio, além de acompanhamento contínuo dos policiais impactados por eventos potencialmente traumáticos.

A iniciativa foi formalizada por meio de Portaria Normativa nº 226/2025/DGPC/MS de 08/05/2025, publicada no Diário Oficial do Estado e é conduzida pela Coordenadoria de Atendimento Psicossocial e Espiritual (Cape), estrutura que integra psicólogos, assistentes sociais e capelães.

A medida foi detalhada pelo coordenador do Departamento de Gestão de Pessoas da corporação, delegado Fabiano Nagata, e pela psicóloga e investigadora Fabiana Pedraza, durante entrevista ao programa Microfone Aberto, da Massa FM Campo Grande.

Delegado, como funciona na prática esse novo protocolo e quando ele é acionado?
delegado Nagata:
 Eu vou começar explicando um pouco a nossa estrutura organizacional. Dentro da Polícia Civil, temos a Delegacia-Geral da Polícia Civil, comandada pelo delegado-geral, Lupercio de Geroni. Temos o Departamento de Gestão Pessoal e a Coordenadoria de Atendimento Psicossocial e Espiritual, que é o Cape, do qual nós fazemos parte e eu sou coordenador. E, no Cape, temos os setores de psicologia, assistência social e capelania, porque isso é muito importante, uma vez que a saúde mental dos profissionais de segurança pública é constantemente desafiada devido à natureza crítica e imprevisível? As situações enfrentadas no exercício da função, com essa exposição frequente de eventos de alto risco, podem gerar impactos significativos no bem-estar psicológico dos policiais, afetando tanto o desempenho profissional quanto a qualidade de vida pessoal. Por isso que veio a portaria que instituiu o protocolo de intervenção em casos de incidentes críticos. Esse protocolo é para a prevenção e o acolhimento voltados à preservação da saúde mental dos profissionais da Polícia Civil que se envolvem em um incidente crítico, que é qualquer evento de alta intensidade emocional com potencial para impactar nas situações de rotina da profissão. E essas situações são definidas na portaria, como: confronto armado, lesão ou morte de colega policial, atendimento a tragédias como homicídio e acidentes graves, violência extrema contra terceiros e outros eventos traumáticos que o policial encontra na ocorrência. A partir da comunicação do fato, a Cape é acionada para prestar o acolhimento inicial ao servidor, avaliar os impactos emocionais e, se necessário, recomendar o afastamento temporário das funções. Esse protocolo tem como objetivo prevenir o adoecimento mental dos policiais. Ele oferece um suporte imediato, acolhimento psicossocial e acompanhamento contínuo aos policiais. Isso aí vem ao encontro com o que estávamos necessitando, precisando mesmo desse apoio aos policiais nessa dura missão do enfrentamento ao crime, nas ocorrências de rua, que são imprevisíveis. Isso é muito importante, pois o policial não sabe o que vai encontrar e isso gera, como ser humano, um impacto na vida dele, na vida da família, traz muito transtorno. E, além do atendimento emergencial, a portaria estabelece medidas preventivas e educativas, como treinamentos sobre gerenciamento de estresse, técnicas de relaxamento e capacitação de gestores para identificação de sinais de adoecimento mental. E o mais importante, a eficácia do protocolo será monitorada por indicadores de adesão e redução de afastamentos por questões psicológicas, com revisão anual das diretrizes.

Fabiana, você que é investigadora e psicóloga, quais são os sinais aparentes mais comuns desse transtorno?
Psicóloga Pedraza:
 Inicialmente, o que a gente percebe após um incidente crítico, é que pode ocorrer o que nós chamamos de estresse agudo. Então, esse policial pode ficar mais ansioso, ter insônia, ter pesadelos em relação à ocorrência. Isso é muito comum acontecer. Contudo, o problema é quando esses sinais permanecem por muito tempo. Quando o policial tem constantes sonhos em relação aos fatos, quando tem o que nós chamamos de flashback, ou quando vai para uma ocorrência semelhante e se apresenta mais ansioso. É assim que o policial pode apresentar o começo de um transtorno que a gente chama de transtorno de estresse pós-traumático. E eu quero alertar a todo policial para que peça ajuda quando se perceber diferente, quando não estiver bem. Quando perceber alteração do sono, ou da alimentação. Esses são sintomas de alertas que a gente precisa prestar atenção no nosso dia a dia e, sim, procurar um especialista, um psicólogo, um médico psiquiátrico. Não tem problema, tá tudo bem não ficar bem. É esse o recado!

E você acredita que ainda há resistência do profissional em buscar ajuda nessa hora, um certo tabu por pensar que não pode demonstrar fragilidade?
Psicóloga Pedraza
: Sim, e não é pouco. Principalmente nos homens. A gente percebe que há uma dificuldade em pedir ajuda, em reconhecer realmente que alguns sintomas podem surgir durante a carreira, durante o trabalho, e que são sintomas de algum tipo de transtorno psiquiátrico. Nós estamos fazendo um trabalho de formiguinha, inclusive, visitamos as delegacias, conversamos pessoalmente com os policiais, para quebrar esse preconceito que se tem em relação ao adoecimento mental. Nessas visitas, proporcionamos café da manhã com os policiais, estamos nos aproximando deles para quebrar esse medo, essa vergonha de ser acionado pela equipe psicosocial.

Delegado, e esse trabalho no interior do estado, vai funcionar da mesma forma como é realizado na Capital ?
Delegado Nagata:
 É do mesmo jeito, né? A competência nossa é no estado inteiro. Então, nós já estamos fazendo o trabalho, começando pelas regionais, cientificando os chefes, os delegados do interior, regionais. Esse trabalho está sendo feito já, só que é mais difícil porque o interior é maior e tem a distância também, mas nós já começamos esse trabalho que é muito importante para toda a nossa equipe da segurança pública.