Quatro anos é o tempo médio que pessoas com algum tipo de deficiência física precisam esperar para concluir o processo de habilitação das categorias A e B em Três Lagoas. A demora acontece não por dificuldades dos futuros motoristas, mas pelo fato de o Departamento de Trânsito de Mato Groso do Sul (Detran) possuir apenas um veículo adaptado para cada modalidade (carro e moto) para atender aos 79 municípios do Estado.
Na manhã de ontem, seis pessoas participaram dos exames de habilitação: quatro para categoria B e dois para categoria A. Os alunos são de Três Lagoas, Água Clara e São Paulo – o aluno de SP iniciou o processo em Campo Grande antes de mudar-se.
Para tirar a carteira de habilitação, os alunos procuram um Centro de Formação de Condutores (CFC) e iniciam o processo, fazendo os exames psicológicos e médico. Como são reprovados nos exames médicos, os candidatos passam por uma perícia, realizada somente na cidade de Campo Grande, onde é avaliada quais adaptações serão necessárias para o veículo. Em seguida, o aluno começa o curso teórico, e depois de concluído,iniciará as aulas práticas.
O Conselho Regional de Trânsito de Mato Grosso do Sul (CRT-MS) disponibiliza veículo adaptado e instrutor para as aulas, sem custo nenhum para os candidatos, porém no estado só existe um carro, uma moto e um instrutor aptos. Essa escassez resulta em atraso no processo. Atualmente, as provas são realizadas uma vez ao ano.
O médico Ary de Queiroz Arão, especialista em medicina do tráfego, explicou como funciona a avaliação dos candidatos a CNH. “Os pacientes são avaliados na parte clínica, neurológica e psicológica, quando diagnosticado outro tipo de deficiência eles são encaminhados para especialistas. Só então a junta médica avalia se o indivíduo pode tentar a CNH e quais adaptações serão necessárias, para posteriormente eles serem avaliados pelos examinadores”. Arão acompanhou toda a prova dos candidatos.
Vânia Aparecida de Jesus Queiroz, tenta há três anos tirar habilitação na categoria B. A permissão para dirigir representa para ela mais independência. Vítima da poliomielite, hoje ela faz tratamento para combater um problema degenerativo da cartilagem – ocasionado por ter andado muito tempo de bicicleta. Ela questiona de quem é a competência para exigir que as autoescolas adquiram um veículo adaptado e ofereçam este tipo de serviço na cidade.
Atualmente, Vânia, que está afastada do serviço devido a complicações com a poliomielite, paga um carro de apoio para ir até a fisioterapia e, para o tratamento feito em Andradina, depende do transporte público e ajuda de amigos. “Só quero tirar a minha carta e ter um pouco de independência. Mas nós, deficientes, ficamos a mercê do Detran. Queremos igualdade, quero pagar as minhas aulas e fazer a prova quando quiser, como é feito com as outras pessoas” desabafou.
Além dela, também participou da avaliação, Cauê Leituga Franco Furtado, que tenta há quatro anos tirar a CNH, para categoria A. Ele reprovou quatro vezes no exame teórico. Depois de fazer a prova prática e ser aprovado, o jovem ficou extremamente emocionado. “Realizei meu sonho de ter a CNH, agradeço o Pio [instrutor Pio de Araújo Filho] que sempre teve muita paciência comigo, nas aulas”.Mais de 470 pessoas foram aprovadas depois de passar pelas aulas do instrutor.
GRATUITO
Segundo informou o instrutor de pessoas com deficiências do Detran MS, Pio de Araújo Filho, desde 2005 o Estado oferece essas aulas sem custo para os deficientes. “Porém a procura é grande, e temos apenas um carro e um profissional. Muitas vezes o trabalho é interrompido porque o carro quebra ou precisa de manutenção, e por se tratar de um bem público o processo demora ainda mais”, completou.
O estado do Mato Grosso do Sul é o único a oferecer as aulas gratuitas para portadores de deficiências. No ano passado um aluno do Piauí participou do exame, informou o instrutor. Em média os candidatos pagam R$ 250 para fazer o exame teórico, fora os exames com os médicos. Cerca de 150 pessoas aguardam para começar as aulas, o instrutor e o carro atendem a 10 regionais do estado.
A próxima avaliação acontece no dia 23 de dezembro, na cidade de Dourados. No exame de Três Lagoas, quatro pessoas foram aprovadas, incluindo a entrevistada Vânia e, como já citado, Cauê.