Na terça-feira, quando cruzou o portão do CT de Saquarema, um filme passou pela cabeça de Ricardinho. No caminho até os quartos, lembrou de tudo, do sabor da comida, das dores, dos sofrimentos, das discussões, de todo o suor derramado para conseguir títulos e das alegrias que tinha vivido ali por tanto tempo. Cinco anos depois de ter sido afastado da seleção brasileira, o ex-capitão reencontrou velhos funcionários que hoje já ocupam cargos diferentes. Está reaprendendo a trabalhar com eles, está em fase de reconquista de espaço e de confiança dos companheiros. Diz que, se pudesse resumir em uma palavra esse retorno que já não esperava mais, seria “emoção”.
– Foi meio estranho, não sabia como agir. Foi como terminar com uma namorada e quando a reencontra, você sabe todos os hábitos dela. Tive aquela sensação de que a namorada estava me esperando. Estou muito feliz – disse o levantador, que já está passando por um trabalho para perder peso em Saquarema.
Bernardinho
Não mudou nada. Antes mesmo de eu começar a treinar ele cobrou coisas que tinha observado na Superliga. Coisas que eu tinha parado de fazer. Ele continua com os treinos cedo, mas está dando mais tempo para a gente descansar. Agora eu estou mais velho e durmo a partir das 21h30m porque tenho duas filhas. Bernardo mudou poucas coisas e eu também. A essência é a mesma. Ele segue cobrando e mandando repetir.
Conversa com o grupo
Não houve. O contato direto foi com o Giba e ele me passava a sensação do grupo. O Bernardo não tem essa coisa de reunir e falar. Ele chama um num canto, depois outro, como eu fiz. Fui conversar com Giba, Rodrigão e Murilo durante a Superliga.
Trote na volta
O Gustavo passou quando voltou, mas acho que isso é coisa de irmão, do Murilo. Eu já mandei a garotada levar a minha roupa para lavar. Só expliquei qual era o caminho mais curto para chegar até lá (risos). É o tipo de brincadeira que fiz com Renan e Lucarelli. Desde garoto eu nunca tomei trote, porque era esperto e ficava sempre perto do chefe (risos).
Família
Está empolgadíssima. Minhas filhas estão muito felizes e eu estou passando tudo para elas todos os dias. A minha mais velha tem 15 anos e, quando tudo aconteceu, ela já entendia o que passei. E eu agora estou mostrando a ela que tudo passou, que tudo aquilo que sofri passou. Estou sentindo tudo, não estou pensando. Quero treinar e fazer o que sei. Elas falavam para mim: "Papai, volta, volta!". A minha esposa ficava mais fria porque passou por aquilo tudo comigo.
Pedido de desculpas
Não teve. Eu e Bernardo nos olhamos e ele falou: "Vamos sentar ali". Conversamos muito sobre Superliga, sobre o time dele no feminino e depois entramos no assunto porque nós dois não somos de enrolação. Perguntei o que era e ele me falou o esquema. Foi uma conversa muito aberta. Mas como eu já disse, nós vamos ter muito tempo dentro de ônibus e avião para trocar ideias só nós dois. Não temos mais idade para ficar pedindo tantas desculpas. Acho que foram erros de todos os lados, de deixar a coisa pegar um tamanho que não conseguimos mais controlar. Foi uma encrenca nossa que deixamos andar.
Condição física
Nunca tive uma lesão séria na carreira. Brinco lá no Vôlei Futuro que estão colocando formol. Fui só uma vez à fisioterapia em Araçatuba. Sou um privilegiado. Aos 36 anos, trabalhar sem dor é uma bênção grande. O que Bernardo pediu é que eu passe para ele tudo o que estou sentindo para que não ocorra uma lesão que não precisa. Cabe a mim mesmo não querer bancar o super-herói e querer treinar igual aos garotos de 20 e poucos anos. Na quinta-feira tive dores musculares, avisei e me passaram gelo.
Parceiro de quarto
Estou dividindo com o Mário Junior (companheiro de time no Vôlei Futuro). Giba foi o meu companheiro de quarto sempre, mas ele já está há 5 anos no mesmo que o Sidão. Mas vou procurar ficar num quarto ao lado do dele.
Adversários
Eles têm que se preocupar porque não vou ficar esperando para ver o que eles vão fazer. Nesses dois anos passei observando alguns centrais e outros eu preciso estudar. Vou pedir esses vídeos montados. Eu quero é fazer muitos deles dançar um pouquinho, quero trançar as pernas deles (risos).
Torcida
No último ano tive uma sensação boa das arquibancadas adversárias. Os fãs do Brasil foram fundamentais nesse processo. A preocupação era grande de voltar e não atropelar algo que está dando certo. Os pedidos para que eu voltasse foram para que desse minha contribuição. Esse foi um primeiro passo.
Ouro em Londres
Fecharia com chave de ouro. Um título olímpico não é fácil, tem uma pressão grande, mas o Brasil está acostumado. Uma medalha de ouro fecharia profissionalmente e pessoalmente algo que estava aberto. Ganhando ou não a convicção é de que se fez a coisa certa.