Três Lagoas teve de junho até hoje 20 casos registrados de estupro contra menores praticados pelo próprio pai. De acordo com dados do Conselho Tutelar da Criança e do Adolescente, o abuso sexual contra a criança é a forma de violência doméstica mais praticada atualmente na cidade. “Atendemos a várias denúncias de agressões, de diversos tipos, contra o menor e o adolescente, mas o estupro vem se mostrando com maior incidência”, afirmou Miriam Monteiro Herrera Hahamed, coordenadora do conselho.
Para Miriam Hahamed, o projeto de lei que o governo enviou essa semana ao Congresso que pune a prática do castigo físico contra a criança e o adolescente vai ajudar ainda mais o trabalho do conselho no combate à violência familiar – quando for aprovado e entrar em vigor. “É mais um alerta aos pais e responsáveis de que a educação é feita com diálogo e não com agressão física”, disse.
Já psicóloga Heloisa Guerra, especialista em psicologia infantil e do adolescente, apóia o projeto de lei, porque ele define também uma punição para o agressor. “Sempre olhamos mais o lado da vítima, mas preciso entender os motivos das agressões e estabelecer penalidades para quem as pratica”, disse. “A violência domestica está aí. É uma realidade e tudo que for feito para acabar com ela é válido”, completou.
PALMADAS
Ela colocou um pouco de pimenta na polêmica das “palmadas pedagógicas”, na medida em que o projeto de lei pode proibir e até punir os pais e educadores que aplicam palmadas, beliscões, empurrões, sacudidelas e outros castigos físicos menores. “Eu sou contra palmadas, porque a criança não faz a ligação do castigo físico com o erro que ela cometeu e isso ainda pode torná-la mais agressiva”, explicou. Por outro lado, Heloisa alerta para a possibilidade do projeto de lei abrir espaço para denúncias falsas. “É comum crianças de oito ou nove anos denunciarem seus pais sem fundamento”, completou. “Denúncias sem comprovação já acontecem e estamos acostumados a lidar com elas”, contou Miriam por outro lado. Os cinco membros do Conselho Tutelar têm experiência suficiente segundo ela, para identificar o que é verdadeiro e falso.
Comprovada a agressão ao menor, o Conselho Tutelar encaminha a criança para o Centro de Referencia Especializada de Assistência Social (Creas), órgão municipal, mantido com recursos federais, onde elas recebem atendimento psicológico e social. “Na medida em que existe toda uma estrutura de apoio ao menor, amparada em leis como a desse projeto, as denuncias aumentam”, afirmou a psicóloga do Creas Priscila Zanardi. “A violência sempre existiu, mas agora as pessoas se sentem mais protegidas para denunciá-la”, argumentou.
DENÚNCIA
“Boa parte desses pais acusados de estupro são desempregados, alcoólatras, que ficam em casa o dia inteiro cuidando das crianças, enquanto as mães estão fora trabalhando”, arriscou Miriam uma explicação para a alta ocorrência de estupro contra menores em Três Lagoas.
Na opinião de Priscila, contudo, o mais importante é que as mães se sintam seguras em denunciar os pais estupradores. “A razão porque isso acontece é complexa. O importante é identificar a agressão, cuidar da criança e punir o agressor”, afirmou.
O projeto de lei tem como objetivo garantir o direito da criança ou jovem de ser educado sem o uso de castigos corporais ou “tratamento cruel e degradante”. E, mais relevante ainda, estabelece a punição para quem pratica esses atos violentos – advertência, encaminhamento a programas de proteção à família e orientação psicológica.
A Lei 8.069, que institui o Estatuto da Criança e Adolescente (ECA), condena maus-tratos, porém não define se os mesmos são físicos ou morais.
Com o projeto, o artigo 18 passa a definir “castigo corporal” como “ação de natureza disciplinar ou punitiva com o uso da força física que resulte em dor ou lesão à criança ou adolescente”.
O telefone de plantão do Conselho Tutelar para denuncias anônimas é 9293 1579.