
Matéria que está em destaque no site Inconsenso (www.inconsenso.com), portal criado por grupo de jornalistas de Campo Grande, onde costumam ser publicadas notícias censuradas pelos donos de veículos de comunicação da Capital, denuncia condições subumanas de peões que trabalharam na Expoinel MS 2009.
Veja a íntegra do texto:
“O que você acha de trabalhar em uma empresa que a unidade do produto pode chegar a mais de R$ 1 milhão? Viajar para o país todo, e também para o exterior? Parece o trabalho dos sonhos de qualquer um. Mas trabalhar para as fazendas de quem cria gado de elite, na prática, assemelha-se mais a vida dos catadores de lixo que existem por todo o Brasil.
Durante a Expoinel MS 2009, em Campo Grande, era evidente que os fazendeiros estavam muito mais preocupados com o bem-estar de seus bois do que o de seus tratadores. “Aqui existem só quatro chuveiros para cerca de duzentos homens”, reclama um deles que não quis se identificar por medo de ser demitido.
A falta de respeito com o trabalhador era evidente, só não viu quem não quis. Do lado de fora do Pavilhão Albano Franco havia dezenas de tatuzinhos (um tipo de cama de campanha totalmente coberta com lona de caminhão) bem ao lado de sacos de lixo, ração para o gado e serragem – que servia de cama para os animais. Do lado de fora também era o único lugar para os peões cozinharem em meio ao mau cheiro.
“Para os touros que eu cuido tem até ventilador que joga água. Quanto a mim, tenho de dormir nesses tatuzinhos quentes. Gado tem mais valor do que gente”.
Na roda onde estavam os tratadores mostrando à reportagem as condições que são submetidos chegou mais um, transtornado. “Não adiantou reclamar, só vai ter quatro chuveiros para gente daqui até o fim da exposição. Imagina quanto tempo vai demorar para todos aqui tomarem banho?”. E banho não era um luxo, pois o ambiente no Pavilhão estava cheio de pó de serra em suspensão que saía da cama dos animais.
"Como um evento que movimenta tanto dinheiro pode tratar as pessoas dessa maneira?", disse uma pessoa que trabalhou no setor executivo do evento. Por ironia os promotores do evento pertencem a uma das classes mais ricas do Brasil e ainda a Expoinel MS teve patrocínio do governo do Estado e também do governo federal.
Um caminhoneiro, que preferiu se manter no anonimato, disse que é assim em qualquer evento. “Em Cuiabá, os chuveiros ficam do lado de fora do parque, a gente sai para tomar banho e quando volta tem de pagar ingresso. Falar que o seu caminhão está lá dentro não adianta, os seguranças não entendem”, conta. “O que custa para essa gente tão rica dar melhores condições para quem trabalha com eles? Pagar um quarto de hotel, fazer instalações nos parques de exposições para os tratadores não pesa para eles”.
Se for para falar de valor, aqui temos alguns: os leilões das Expoinel somaram R$ 17 milhões, conforme o site do evento. A venda de apenas 33% da vaca Marani JS saiu por vinte parcelas de R$ 20 mil, que totalizam R$ 400 mil. A tal Marani pertence a Cícero de Souza (conselheiro do Tribunal de Contas de MS) e do cantor sertanejo Zezé Di Camargo.
“O gado pode ser de elite, mas o peão sofre do mesmo jeito”, conclui um dos tratadores.
Segundo o site Nelore MS, a Expoinel contou com a presença da secretária de Desenvolvimento Agrário, da Produção, da Indústria, do Comércio e do Turismo, Tereza Cristina, do governador André Puccinelli, que participou de um dos leilões, o secretário de Obras Públicas e de Transportes Edson Girotto, o presidente do Tribunal de Contas, o desembargador Cícero de Souza, o presidente da Acrissul Francisco Maia, o diretor da Famasul Dácio Queiroz, o proprietário da Sete Estrelas Embriões Oswaldo Possari, entre outros e criadores e expositores do Estado e a mídia segmentada e aberta compareceu em grande número. Porém, os jornalistas não puderam noticiar o outro lado da exposição. Agora, onde está o Ministério do Trabalho e o Ministério Público?”.